PRECISAMOS FALAR SOBRE A EROTIZAÇÃO DA MULHER LATINA - um relato

O texto a seguir contém o relato pessoal e perspectivas da autora acerca das dificuldades que mulheres (especialmente latinas) sofrem em uma sociedade machista e estruturalmente patriarcal.

Por Livia Salatta.

Ter a oportunidade de residir nos Estados Unidos desde 2019 fez com que eu conhecesse e experienciasse os estereótipos que toda mulher latina carrega. Viver sob tantos achismos e julgamentos, na maioria das vezes é muito desconfortável. O Brasil é conhecido por ter mulheres lindas (e na visão dos gringos, fáceis). Muitas vezes, é como se os olhares pré-julgadores não pudessem ser evitados todas as vezes em que eu disse que era brasileira.  

 

Lembro-me bem de uma situação em que a minha chefe americana estava opinando sobre as escolhas das roupas das mulheres latinas e que segundo o seu conceito, as latinas se vestem como whores (prostitutas). Eu fiquei embasbacada com o comentário de péssimo gosto e por motivos de precisar do emprego, (infelizmente) fui sutil em tentar dizer o quanto aquela afirmação estava completamente equivocada. 

 

É incômodo ser julgada pelo meu país de origem. Para os gringos é como se o Brasil fosse um grande carnaval e que todas as mulheres brasileiras (obrigatoriamente) tivessem que ter a bunda grande, saber sambar igual a globeleza e ser sempre simpática e sorridente. Além disso, muitas brasileiras que se casaram com estrangeiros comumente reclamam de terem se sentido taxadas como interesseiras pelos parentes e amigos do noivo. 

 

Não por acaso, a empresa americana de esmaltes OPI criou um esmalte denominado “me beije, sou brasileira”. Só contribuindo para reforçar o machismo que objetifica as mulheres brasileiras. Chega a ser cômico que a frase escolhida para batizar o esmalte soe como uma ordem e, automaticamente uma permissão. Okay, então só porque eu sou brasileira você deve me beijar e eu não vou fazer nenhuma objeção. Sim, isso está acontecendo em pleno século 21. 

 

Luiza Testa foi a curadora de uma exposição em Nova Iorque idealizada pela artista visual Santarosa Barreto, a qual, dentre outras obras, criou um letreiro neon luminoso com os dizeres "Are you Brazilian? Oh, I love Brazilian women" [você é brasileira? Ah, eu amo mulher brasileira], expondo a erotização que a mulher brasileira enfrenta no exterior. 

 

Luiza brilhantemente acrescenta que: “O imaginário estrangeiro é permeado pela ideia de um Brasil totalmente disponível tanto em termos de território quanto em relação às mulheres. Algo que remete à colonização, à escravidão e a um ideal folclórico e erotizado sobre o país. Homens estrangeiros habitualmente acreditam ter uma abertura com a mulher brasileira que, na verdade, não têm. Em muitos países europeus, as mulheres brasileiras estão associadas à prostituição, como se isto autorizasse de alguma maneira a importunação sexual. O homem enxerga o corpo de uma prostituta como sendo público, uma mulher que julga ser promíscua ou propositalmente sensual - acrescenta a curadora”. 

 

Reforçando ainda mais os dissabores vivenciados pelas brasileiras no exterior, o perfil no Instagram @brasileirasnaosecalam traz inúmeros relatos de assédio e xenofobia sofridos por mulheres que moram em Portugal. 

 

No cinema a representação da mulher latina também não é diferente. O estudo “Cinema Hollywoodiano e a Construção do Estereótipo da América Latina: a sexualização da mulher latino-americana", apontou que o cinema norte americano representa a América Latina como um todo, desqualificando características que deveriam ser individuais, reforçando os estereótipos.  

 

O trabalho também demonstrou que o cinema norte americano atribui (mesmo indiretamente) características negativas as mulheres latinas, muitas vezes fazendo uma oposição entre a mulher latina e a norte-americana, “por exemplo, a mulher permissiva (a latina) em contradição à jovem inocente (a norte-americana). Ou seja, não se estabelece só um estereótipo da mulher latina, se faz uma comparação entre comportamentos femininos, afirmando qual o correto (EUA) e qual o errado (AL)”, conclui os autores. 

 

Parece ser até obvio escrever que a América Latina é formada por muitos países e culturas. As pessoas são diferentes, mesmo quando elas são parte de uma mesma ideia preconcebida. Julgar uma mulher com base numa informação generalizada e estereotipada, é, no mínimo um erro. As mulheres trazem consigo características que as tornam únicas, independentemente de seu país de origem. O caminho é longo, muita desconstrução ainda precisa ser feita para que todas nós possamos ter a liberdade de sermos o que quisermos. 

 

Fontes de pesquisa e links para visitar: 


Para publicar no The Crime Jurídico entre em contato

https://lnk.bio/thecrimejuridico


Me siga no Instagram

https://www.instagram.com/liviasalatta/


💀 Assine o Patreon

conteúdos exclusivos e clube de membros

https://www.patreon.com/thecrimebrasil

Comentários

Postagens mais visitadas